FOLHAS DE ROSA// SUPREMA FLORAÇÃO
Todas as prendas que me deste, um dia,// Agasalhadas há muito na galeria de tu'alma
Guardei-as, meu encanto, quase a medo,// Para olhar e sentir com sutil caridade,
E quando a noite espreita o pôr do sol,/ Fica mais doce o inútil, o que me acalma
Eu vou falar com elas em segredo...// Num bem estar de religiosa sinceridade...
E falo-lhes d’amores e de ilusões,// Em soluços tristonhos e comovidos,
Choro e rio com elas, mansamente...// Embebedada do sinistro vinho...
Pouco a pouco o perfume de outrora// Nos meus sentidos envolvidos, requintados
Flutua em volta delas, docemente...// Num mundo estranho,mundo comezinho...
Pelo copinho de cristal e prata// Quebrando augustos timbres do Mistério
Bebo uma saudade estranha e vaga,// Que a febre das insânias adormece...
Uma saudade imensa e infinita// Sob simbolismo de desdém funéreo
Que, triste, me deslumbra e m’embriaga// Dentre surdina da lágrima que estremece
O espelho de prata cinzelada,// Através de raios fluídicos
A doce oferta que eu amava tanto,// Numa luxúria deslumbrante, aveludada
Que refletia outrora tantos risos,// A espelhar sons tardios, porém rítmicos
E agora reflete apenas pranto,// Sob ondeada sensação transfigurada!
E o colar de pedras preciosas,// Dentre os nevoeiros do luar fluindo
De lágrimas e estrelas constelado,// À esperar-te de luz maravilhados
Resumem em seus brilhos o que tenho// Basta crer in_definidamente, usufruindo
De vago e de feliz no meu passado...// Para gozar meus caminhos rendilhados...
Mas de todas as prendas, a mais rara,// A penetrar nos dons que fatalmente selam
Aquela que mais fala à fantasia,// Ao arrancar grilhões que nos flagelam
São as folhas daquela rosa branca// Porquanto numa luz i_mortal e transcendente
Que a meus pés desfolhaste, aquele dia...// No tempo e tanto, por demais surpreendente!
Florbela Espanca// Marilândia Marues Rollo