sexta-feira, 26 de setembro de 2025

CICLO DE AUTORRETRATO

ciclo completo em três sonetos, no estilo de António Nobre, formando um retrato poético em três tempos — dor, esperança e plenitude. I – Espelho da Minha Dor No meu olhar há névoa e solidão, Um mar sem porto, errante navegante, Sou pranto antigo, canto vacilante, Sou sombra fria em triste procissão. Na alma guardo apenas ilusão, Um fado amargo, eterno e sufocante, Sou sonho morto, verso agonizante, Sou nau perdida em turvo coração. E neste espelho vejo o que não sou, Um vulto errante, a bruma que ficou, Lembrança vã, criança sem calor. Sou melodia que ninguém entendeu, Sou lira triste que já se perdeu, Sou todo o nada — espelho da minha dor. II – Luz Escondida Sou peregrino em brumas do caminho, No peito a dor que nunca se desfaz, Mas levo em mim um sopro de carinho, Um sonho tênue que ainda me traz paz. Entre saudades sigo tão sozinho, Procurando nos céus um rastro audaz, Talvez a estrela, em seu fulgor mansinho, Me guie a um porto onde descanso jaz. E se a tristeza é minha companheira, Também me cerca a fé derradeira De um novo canto que há de renascer. Pois mesmo a alma, exausta e dolorida, Guarda no fundo a chama escondida Que insiste, teima, em nunca se morrer. III – Plenitude Silenciosa Depois da sombra, a luz enfim me invade, Como quem sonha e acorda em claridade, Sou alma livre, feita de saudade, Que encontra a paz no seio da verdade. Já não me pesa a dor da tempestade, Nem me aflige o sopro da ansiedade, Sou mar sereno, em doce eternidade, Sou verso puro, em plena liberdade. Na solidão, já não me sinto só, Pois cada estrela é música e é pó Que me conduz ao íntimo esplendor. Assim me vejo — em calma redentora, Sou chama eterna que jamais se apaga, Sou plenitude, sou silêncio e flor. ✨ Esse ciclo pode ser lido como um autorretrato espiritual em três fases: o abismo da dor, a centelha da esperança e a chegada à serenidade.

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