Brinde à Escuridão
Brinde à Escuridão No cristal do cálice, o sangue da noite repousa, Enquanto rosas negras bebem deste licor de sombras. Que vinho é este que nutre flores da escuridão? Que lua é esta que testemunha nosso silencioso ritual? O líquido escorre como lágrimas de obsidiana, Desenha veios rubros nas paredes transparentes, Como se o vidro sangrasse memórias antigas, De amores que morreram antes do amanhecer. As rosas negras, orgulhosas em sua impossibilidade, Erguem-se do veneno que deveria matá-las. Seus espinhos cortam o céu da noite, Desafiando a própria lua a tocá-las. É um brinde invertido este que contemplo: Não é a vida que nutre a flor, mas a morte. Não é a luz que a faz crescer, mas a escuridão. Não é o dia que a desperta, mas a lua cheia. Quem seria corajoso o suficiente para levar aos lábios Este cálice onde nadam pétalas de abismo? Quem ousaria provar o gosto amargo Do néctar que alimenta o que não deveria existir? A lua observa, cúmplice silenciosa, O pacto entre o que sangra e o que espeta, Entre o líquido que embriaga e a flor que entorpece, Entre o cristal que contém e a noite que liberta. Rosas nascidas do vinho, ou seria vinho nascido das rosas? A fronteira entre um e outro se dissolve na escuridão. Neste cálice, todos os contrários se encontram: Beleza e dor, prazer e veneno, vida e morte. Brindo com os olhos, não com os lábios, A este arranjo proibido de elementos noturnos. E a lua, testemunha de todos os segredos, Reflete-se no vermelho-sangue como em um espelho d'água. Para quem tem sede de mistério, Para quem tem fome de beleza sombria, Este cálice transbordante de noite É o único alimento que pode saciar. Marilândia

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