segunda-feira, 14 de abril de 2025

(HERBERT HELDER) O POEMA

O Poema - I (HERBERT HELDER) Um poema cresce inseguramente na confusão da carne. Sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto, talvez como sangue ou sombra de sangue pelos canais do ser. Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência ou os bagos de uva de onde nascem as raízes minúsculas do sol. Fora, os corpos genuínos e inalteráveis do nosso amor, rios, a grande paz exterior das coisas, folhas dormindo o silêncio — a hora teatral da posse. E o poema cresce tomando tudo em seu regaço. E já nenhum poder destrói o poema. Insustentável, único, invade as casas deitadas nas noites e as luzes e as trevas em volta da mesa e a força sustida das coisas e a redonda e livre harmonia do mundo. — Em baixo o instrumento perplexo ignora a espinha do mistério. — E o poema faz-se contra a carne e o tempo. HERBERT HELDER RÉPLICA DE MARILÂNDIA A Gênese do Verso Um verso nasce hesitante no labirinto das veias. Emerge ainda sem forma, pura fome e instinto, talvez como seiva ou rumor de maré pelos corredores da alma. Lá fora respira o universo. Lá fora, a magnífica dança ou as sementes de estrelas de onde brotam as invisíveis raízes da luz. Lá fora, os contornos autênticos e imutáveis da nossa existência, vulcões, a vasta quietude externa dos elementos, pétalas bebendo o orvalho — a hora sagrada da colheita. E o verso cresce abarcando tudo em seu abraço. E já nenhuma força aniquila o verso. Indomável, singular, penetra as paredes submersas nos sonhos e os clarões e as sombras ao redor do abismo e a tensão contida dos objetos e a pulsante e selvagem melodia do cosmos. — No fundo o coração atônito desconhece a arquitetura do enigma. — E o verso ergue-se contra a morte e o relógio. Marilândia

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