QUANDO EU NÃO TE TINHA (ALBERTO CAEEIRO- heterônimo de Fernando Pessoa)
QUANDO EU NÃO TE TINHA (ALBERTO CAEEIRO- heterônimo de Fernando Pessoa) Quando eu não te tinha Amava a Natureza como um monge calmo a Cristo… Agora amo a Natureza Como um monge calmo à Virgem Maria, Religiosamente, a meu modo, como dantes, Mas de outra maneira mais comovida e próxima… Vejo melhor os rios quando vou contigo Pelos campos até à beira dos rios; Sentado a teu lado reparando nas nuvens Reparo nelas melhor — Tu não me tiraste a Natureza… Tu mudaste a Natureza… Trouxeste-me a Natureza para o pé de mim, Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma, Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais, Por tu me escolheres para te ter e te amar, Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente Sobre todas as coisas. Não me arrependo do que fui outrora Porque ainda o sou. Alberto Caeiro, O pastor amoroso RÉPLICA DE MARILÂNDIA Quando Te Encontrei Quando te encontrei Amava o mundo como um náufrago ama a estrela-guia... Agora amo o mundo Como a raiz cansada ama a chuva de verão, Devotamente, à minha maneira, como antes, Mas de outra forma mais vibrante e viva... Vejo o rio mais claro quando teus olhos são o céu que nele se reflete Pelos campos que são páginas onde escrevemos nossos passos; Sentado ao teu lado, contemplando as nuvens-pensamentos Que navegam no azul da nossa tarde compartilhada — Tu não me roubaste o mundo... Tu o transformaste em poema... Trouxeste o universo para dentro do meu peito, Por existires, vejo-o mais luminoso, embora seja o mesmo, Por me amares, amo-o da mesma forma, mas com a intensidade de mil sóis, Por me escolheres como jardim para tua semente de afeto, Meus olhos tornaram-se lunetas que contemplam mais profundamente A face secreta de todas as coisas. Não me arrependo de ter sido aquele deserto solitário Porque ainda sou areia, só que agora, oásis. Marilândia

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