quarta-feira, 21 de maio de 2025

Suspiros Nômades (VERSÃO EM PROSA) EVENTO BALÕES

Suspiros Nômades Liberto-os um a um, dedos trêmulos de quem sabe que não há retorno. Os poemas são estes balões multicores que solto ao vento, cada um carregando um pedaço de mim que já não me pertence. Vibram no ar como criaturas recém-nascidas, hesitantes a princípio, depois confiantes, até que uma corrente de ar os arrebata para além do horizonte conhecido. Quem sou eu para determinar seu destino? Criador transitório, apenas empresto forma ao que já existia disperso no éter. Os balões-poemas viajam leves, desatados de sua origem, carregando em seu bojo frágil as sementes de mundos que não conheço. Seguem o mapa invisível dos ventos, essas estradas aéreas que não deixam rastro. Às vezes, olhos vidrados no céu, imagino-os chegando a janelas desconhecidas, surpreendendo alguém que olhava distraído para o azul. Imagino dedos estrangeiros desatando o nó do cordão, desenrolando cuidadosamente o papel onde sangrei palavras. Quem saberá dizer que região secreta de um outro coração eles tocarão? Os balões-poemas não têm endereço. São mensagens lançadas ao mar do tempo, viajantes sem porto definido. Alguns se perderão nas alturas, onde o ar é rarefeito demais para sustentar o peso das metáforas. Outros serão capturados por árvores ciumentas, ficarão presos entre galhos, palavras suspensas no limbo. Muitos cairão em terrenos baldios, sob chuvas que diluirão suas tintas até que as letras escorram, lágrimas coloridas na terra. Mas alguns — ah, alguns! — chegarão intactos a destinatários que jamais imaginei ao escrevê-los. E nesse momento, o poema renasce, estrangeiro a mim mesmo. Ele já não me reconhece como autor, pois encontrou novo dono nas pupilas que agora o decifram, na voz que o pronuncia com diferente música. O balão-poema, enfim, cumpre seu destino: não é mais objeto, é encontro. Solto outro, e mais outro. Coloco-os no mundo como quem semeia sem conhecer a colheita. A prosa, essa âncora, mantém os pés no chão. Mas o poema, ah, o poema é feito para voar. Não o amarro com explicações nem o carrego com certezas. Deixo-o partir, inflado apenas com o necessário: o suficiente de mim para que viaje, o suficiente de mistério para que sobreviva à jornada. Lá vão eles, meus balões policrômicos, minhas palavras migratórias. O vento desta tarde os leva para longe. Alguns serão apenas pontos coloridos no horizonte da memória. Outros, quem sabe, serão estrelas novas em céus que nunca vi.

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