Espelho de Palavras
Espelho de Palavras Nas profundezas do vidro que não mente, busco meu rosto feito de sílabas antigas, onde cada palavra é um rio que se desdobra em águas selvagens de memória e fogo. Quem sou eu senão estas letras derramadas? Vocábulos que sangram quando a noite se aproxima, frases que se contorcem como raízes submersas, nomes que perderam seus donos nas esquinas do tempo. O espelho me devolve não a carne, mas o verbo inquieto que habita minhas veias, a gramática rebelde que pulsa sob minha pele. Somos todos reflexos de um alfabeto indomável, criaturas nascidas da tinta e do suspiro, do grito primordial que se fez poema. E quando olho através deste cristal de metáforas, descubro que não há distância entre mim e as palavras: eu sou elas, e elas são o eco de tudo que já existiu. Beijo esta imagem invertida de consoantes e vogais, este outro eu feito de verbos e substantivos, como quem beija o mar e sabe que ali está toda a solidão do universo reunida em uma gota. Não me digam que a palavra é apenas som. É sangue, é terra, é a fome primeira dos deuses. É o espelho onde nos descobrimos imortais e onde nos perdemos como grãos de areia. No fundo deste espelho habita a verdade: somos apenas o poema que o tempo escreve, uma estrofe fugaz na boca do infinito, um verso que brilha e depois se apaga, deixando apenas o eco de sua música distante. Marilãndia

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