"A POESIA EXPRESSA IDEIAS E EMOÇÕES, MAS NUNCA DE MANEIRA CLARA, PARA , ATRAVÉS DO MISTÉRIO E DO ENIGMA, ATIVAR A IMAGINAÇÃO DO LEITOR."
segunda-feira, 28 de abril de 2025
Brinde à Escuridão
Brinde à Escuridão
No cristal do cálice, o sangue da noite repousa,
Enquanto rosas negras bebem deste licor de sombras.
Que vinho é este que nutre flores da escuridão?
Que lua é esta que testemunha nosso silencioso ritual?
O líquido escorre como lágrimas de obsidiana,
Desenha veios rubros nas paredes transparentes,
Como se o vidro sangrasse memórias antigas,
De amores que morreram antes do amanhecer.
As rosas negras, orgulhosas em sua impossibilidade,
Erguem-se do veneno que deveria matá-las.
Seus espinhos cortam o céu da noite,
Desafiando a própria lua a tocá-las.
É um brinde invertido este que contemplo:
Não é a vida que nutre a flor, mas a morte.
Não é a luz que a faz crescer, mas a escuridão.
Não é o dia que a desperta, mas a lua cheia.
Quem seria corajoso o suficiente para levar aos lábios
Este cálice onde nadam pétalas de abismo?
Quem ousaria provar o gosto amargo
Do néctar que alimenta o que não deveria existir?
A lua observa, cúmplice silenciosa,
O pacto entre o que sangra e o que espeta,
Entre o líquido que embriaga e a flor que entorpece,
Entre o cristal que contém e a noite que liberta.
Rosas nascidas do vinho, ou seria vinho nascido das rosas?
A fronteira entre um e outro se dissolve na escuridão.
Neste cálice, todos os contrários se encontram:
Beleza e dor, prazer e veneno, vida e morte.
Brindo com os olhos, não com os lábios,
A este arranjo proibido de elementos noturnos.
E a lua, testemunha de todos os segredos,
Reflete-se no vermelho-sangue como em um espelho d'água.
Para quem tem sede de mistério,
Para quem tem fome de beleza sombria,
Este cálice transbordante de noite
É o único alimento que pode saciar.
Marilândia
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